A rotina de quem não pode treinar com seus companheiros em tempos de quarentena

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Pandemia forçou atletas de esportes como vôlei, vôlei de praia e basquete a ficarem longe de seus companheiros. O técnico da Seleção Brasileira Renan, o campeão olímpico Bruno Schmidt e o ala Alex Garcia contam como lidam com a situação

Assim como praticamente todos os setores da sociedade, o esporte foi impactado diretamente pelos efeitos da pandemia do COVID-19. Com os atletas de todo o planeta vivendo as restrições impostas pelas quarentenas adotadas na maioria dos países das Américas, da África, da Europa, da Ásia e da Oceania, treinar normalmente no alto rendimento é quase impossível nos dias de hoje.

Com os centros de treinamento, academias e clubes fechados, manter a forma com exercícios em casa tem sido a alternativa adotada pela maioria. Mas, no caso dos atletas de modalidades coletivas ou de esportes de duplas, a situação torna-se um pouco mais complicada, pois manter a forma é só uma parte da equação. Para ter sucesso, nesses casos, é preciso o trabalho em grupo, o que não pode ser realizado no momento.

Evandro saca, observado por Bruno na etapa de Doha do Circuito Mundial, última disputada pela dupla antes da quarentena. Foto: FIVB

O momento agora é de sair um pouco do personagem atleta, da nossa função, e entrar no de cidadão normal. Temos que pensar em superar esse momento como todo cidadão e depois pensar em voltar a ser atleta novamente”
Bruno Schmidt, campeão olímpico no Rio 2016

Campeão olímpico no vôlei de praia nos Jogos do Rio 2016, o brasiliense Bruno Schmidt está de quarentena em casa, em Vila Velha, no litoral do Espírito Santo, enquanto seu parceiro, Evandro, faz o mesmo no Rio de Janeiro. Sem o contato diário e com as praias fechadas, a dupla simplesmente não tem como trabalhar. Ciente de que o momento de crise exige sacrifícios de todos, Bruno diz que é preciso adotar um novo papel: o de cidadão.

“O Evandro fica lá no Rio, eu fico aqui em Vila Velha. A gente tenta fazer o que pode e cumprir um cronograma bem fraquinho, mas não é nada de que um atleta precise. Mas o momento agora é de sair um pouco do personagem atleta, da nossa função, e entrar no de cidadão normal. Temos que pensar em superar esse momento como todo cidadão e depois pensar em voltar a ser atleta novamente. A gente vai perder a parte física, não tem como. Mas é uma situação que está atrapalhando todo mundo: os lojistas, as empresas… No nosso caso, a gente tem que ter o contato diário com a bola e com o seu parceiro, mas estamos confiantes de que teremos tempo hábil para contornar tudo isso”, diz, referindo-se ao fato de os Jogos Olímpicos de Tóquio 2020 terem sido adiados para julho de 2021. Bruno e Evandro já estão classificados para as Olimpíadas.

“No vôlei de praia, a gente trabalha muito com o calendário. Quando foi definido que a Olimpíada passou para 2021 a gente percebeu que teríamos um tempo para vencer essa batalha e para pensar e redesenhar uma preparação para 2021”, opina.

“As competições caíram todas, como em todas as modalidades, e a gente está meio que sem saber como lidar, obrigados a ficar de quarentena, por motivos óbvios, para evitar ao máximo a disseminação do vírus. Todos os atletas estão sendo solidários, mas gera uma dúvida sobre como vai ficar o cenário esportivo e como é que vai ser revertida essa situação. A gente sabe que a Olimpíada vai ser em 2021, mas como é que vai ser a caminhada até lá? Como vão ser as competições? Elas vão se manter? Essa situação vai se complicar ainda mais ou não? Esse mar de incertezas todo mundo vive.”

Enquanto as respostas não chegam, Bruno vai se virando. “Dentro de casa eu tento fazer tudo o que dá: fazer uma bicicleta ergométrica, trabalhos de estabilização de ombro, que é muito necessário para o pessoal do vôlei… a gente vai tentando ao máximo se exercitar.”

Com mais tempo livre, o campeão olímpico tem se dedicado, além do desafio de manter a forma, a uma outra tarefa: “Estou tentando também fazer coisas que já queria estar fazendo. Voltei à faculdade (de direito), estou estudando e podendo cuidar desse lado da minha vida que dou muito valor. Estou tentando ao máximo fazer coisas produtivas, porque não tem como eu ser o melhor atleta que eu posso ser nesse momento de quarentena. O melhor é tentar manter a mente ocupada, comer bem e manter uma rotina diária e não agir como se estivesse de férias”, conclui.

Sem fé no retorno do NBB

A situação de Bruno é similar à de Alex Garcia, um dos jogadores de basquete mais admirados do país, atleta do Minas e da Seleção Brasileira, eleito melhor ala do Novo Basquete Brasil (NBB) nas temporadas de 2008/2009, 09/10, 10/11 e 11/12.

Alex Garcia, em ação contra o Corinthians pelo NBB. Foto: NBB

“A criatividade tem que estar muito boa para poder movimentar o corpo. Um dia pela manhã eu faço uma coisa, à tarde faço outra. Tenho uma piscina aqui em casa e eu nado bastante junto com minhas filhas. Essa é a atividade que eu mais faço”
Alex Garcia, ala do Minas e da Seleção Brasileira

“Com essa parada por causa do coronavírus, o mundo parou. Não só o mundo esportivo, mas quase tudo está parado. O NBB também. Só que a gente não pode parar. Ninguém sabe se vai voltar o campeonato ou não. Eu, particularmente, duvido que volte, porque a perda é grande. Por mais que a gente esteja fazendo alguma coisa de atividade física, não é a mesma realidade do que a gente está acostumado no nosso dia a dia de treinamento”, pondera Alex.

“A gente perde muita massa muscular e muito ritmo de jogo. Então, eu duvido que o campeonato volte por causa disso. Mesmo que o NBB tenha dito que vai dar uma semana de treinamento antes de voltar o campeonato, duvido que qualquer jogador volte a jogar depois de uma semana apenas. Mesmo assim a gente não pode parar e a criatividade tem que estar muito boa para movimentar o corpo. Eu estou nessa pegada. Um dia pela manhã faço uma coisa, à tarde faço outra. Tenho uma piscina aqui em casa e nado bastante junto com minhas filhas. Essa é a atividade que mais faço”, revela Alex, que também tem se dedicado aos estudos e adotado uma atenção especial à alimentação nesses tempos de quarentena em Ribeirão Preto, onde mora com a família.

“Também tento ajudar nas tarefas de casa e estou fazendo faculdade de educação física a distância. Ou seja, foco também na faculdade. E procuro não comer muito, porque ficar em casa é sinônimo de fome e a gente come bastante. Então estou me policiando bastante para não passar do limite.”

À espera de uma definição

Técnico da Seleção Brasileira masculina e da equipe de Taubaté na Superliga Masculina, Renan Dal Zotto vive atualmente um compasso de espera por definições para que possa traçar o planejamento para os times que comanda.

Foto: FIVB/Divulgação

“Em relação à Seleção Brasileira, nós estamos bastante ansiosos. Estamos sempre respeitando essa prioridade de dar 100% de segurança às pessoas, mas fica muito difícil a gente conseguir planejar alguma coisa. Os Jogos Olímpicos foram adiados para 2021 e com isso ganhamos um ano a mais de trabalho. Vamos ter que sentar e planejar novamente”
Renan, técnico da Seleção Brasileira masculina

“Estamos vivendo um momento bastante delicado no mundo e aqui no Brasil também, onde as tomadas de decisões acontecem quase que diariamente. As competições nacionais foram todas suspensas e algumas canceladas. No caso do voleibol, na Superliga o feminino foi cancelado e no masculino foi suspenso. No dia 20 teremos uma reunião para ver se a competição continua mais para frente ou se ela é também cancelada. É claro que no entendimento de todos os clubes o mais importante é a saúde e a segurança de todas as pessoas, atletas, torcedores, comissões técnicas e de toda comunidade que envolve esse grande movimento que é o esporte”, diz Renan.

“Em relação à Seleção Brasileira, estamos bastante ansiosos. Estamos sempre respeitando essa prioridade de dar 100% de segurança às pessoas, mas fica difícil a gente conseguir planejar alguma coisa. Os Jogos Olímpicos foram adiados para 2021 e com isso ganhamos um ano a mais de trabalho. Vamos ter que sentar e planejar novamente. Fizemos três anos bem planejados e detalhados para chegar em 2020 e com a mudança dos Jogos nós ganhamos mais 12 meses para trabalhar”.

Para Renan, a definição de que os Jogos Olímpicos foram adiados para julho do ano que vem abre uma nova chance para que novos atletas possam buscar um lugar no time que vai defender o Brasil nas Olimpíadas de Tóquio.

“O leque muda completamente, porque abre para novos talentos. Vamos ter mais uma competição nacional, que é a Superliga (em 2021), bastante importante no cenário nacional para que se perceba e analise novos jogadores e com isso teremos uma preparação totalmente diferente para 2021. Vamos aguardar as definições da Federação Internacional (de Vôlei, a FIVB) quanto às competições. Tínhamos, no início do ano, a Liga das Nações, que foi cancelada e transferida para o segundo semestre sem termos a segurança de que realmente vai acontecer. Mas para o ano que vem ela está agendada para o primeiro semestre, antes dos Jogos Olímpicos de Tóquio em 2021. Na medida em que as coisas forem ficando mais claras, teremos subsídios para montar o novo planejamento e dar continuidade ao nosso plano de voo para chegar em Tóquio 2021 com força total”, encerra o treinador.

Luiz Roberto Magalhães – rededoesporte.gov.br

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