Ciência e política no caso da covid-19 no Maranhão

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Publicamos uma análise, há dois dias, comentando os resultados do modelo desenvolvido pelo Imperial College para o Maranhão. Nela, apresentamos a tese de que as medidas de flexibilização que estão sendo tomadas agora pelo Governo do Maranhão estão equivocadas.

Partimos do pressuposto científico que indica que o índice de reprodução da transmissão (Rt) precisaria estar abaixo de 1 para que medidas de relaxamento social não pudessem ter o efeito ‘rebote’, ou seja, uma nova retransmissão e crescimento do contágio no Maranhão.

Desde ontem, o respeitado epidemiologista da Ufma, professor Dr. Antônio Augusto Moura, tem feito pronunciamentos públicos sobre a situação de São Luís e do Maranhão. Ele sustenta que em situações em que RT > 1 não pode ser admitido a possibilidade de flexibilização das medidas de controle social, pois a probabilidade do ‘efeito rebote’ é bastante considerável, já que a transmissão da covid-19 se dá, fundamentalmente, por contato e proximidade dos corpos físicos. Assim, a previsibilidade mais confiável é aquela de curto prazo – por período de 7 dias -, pois a transmissão da doença é dependente do comportamento social das pessoas. Ela pode variar muito rapidamente de um período curto para outro. Isso significa que a tendência de diminuição do crescimento da transmissão, em razão de dias, poderá voltar a crescer de maneira bastante significativa.

Tivemos uma variação sensível, mas importante, do Rt do dia 27 para 28 de maio. Na primeira data, o registro foi de 1,18 e no segundo de 1,32. Como a tendência é de relaxamento social e de indisciplina do comportamento das pessoas, tudo indica que nas próximas semanas teremos o ‘efeito rebote’ da contaminação em São Luís, ou seja, uma nova onda de contaminação crescente.

Hoje, temos 27.979 de casos confirmados e 887 óbitos confirmados pela covid-19 no Maranhão. A taxa estimada de subnotificação varia em torno de 85-90%. Em apenas 7 dias, poderemos ter uma variação da casa dos 20 mil para mais de 60 mil nos casos confirmados em todo o Estado.

Nesse sentido, ainda não é momento para nenhuma medida de flexibilização. Como é inaceitável que alcancemos a ‘imunidade de rebanho’ – que significa ter tido 70% da população de São Luís, por exemplo, contaminada (em torno de 1 milhão de pessoas) -, hoje temos apenas 5% da população infectada confirmada. Os critérios objetivos são, segundo o professor Antônio Augusto Moura:
1) Rt abaixo de 1 por um período considerável, ou seja, entre 2 ou 3 semanas;
2) Baixa taxa de ocupação dos leitos de UTI’s (em torno de 50%);
3) Capacidade de testagem em massa para localizar os casos e proceder medidas preventivas de isolamento;
4) Uso universal de máscaras até que uma vacina seja descoberta.

A política que busca administrar interesses que se mostram inconciliáveis hoje não é capaz de garantir o bem estar da população. Preservar as vidas – logo, conter a covid-19 -, é a única maneira de recuperar a economia no longo prazo. Os grandes empresários no Maranhão e no país tem demonstrado sua enorme incapacidade de conexão com as condições de vida da maioria. Flávio Dino foi eleito pela parte majoritária da população e não para atender, exclusivamente, interesses econômicos mesquinhos e rasteiros. A pesquisa científica séria – que não está submetida à ‘política’ -, não recomenda abertura ou flexibilização de nenhuma medida de relaxamento social. O ‘efeito rebote’ custará muitas vidas e, infelizmente, nos tornará piores moralmente.

Lamento dizer, mas as classes dominantes não podendo reproduzir automaticamente um novo Auschwitz, adotam o gozo da seleção natural com forma de eliminação social. A Reforma da Previdência é apenas um parente próximo da liberação geral para que a contaminação se desenvolva sozinha e estabeleça uma taxa de mortalidade cruel e significativa. Governos de esquerda deveriam agir na contramão do alarme de incêndio. É o único ‘meio-termo’ aceitável.

Saulo Pinto, professor do Departamento de Economia da Ufma.

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