Marco D’Eça conta tudo ao Jornal Pequeno

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Após sua saída do jornal O Estado do
Maranhão, o jornalista Marco Aurélio D’Eça resolveu dedicar-se integralmente ao blog que mantém desde 2006. Formado na Ufma com especialização em Jornalismo Digital, ele iniciou-se profissionalmente na Rádio Esperança FM, em 1992. Foi também repórter, subeditor e editor de política do jornal O Estado, onde chegou em 1993.
Aos 45 anos, casado, pai de três filhas, Marco D’Eça vem também profissionalizando-se como pequeno empresário. Ele resolveu dar
uma guinada em sua vida profissional, quando decidiu sair do jornal da família Sarney, onde era editor de política.
Agora, em face do novo cenário político
do Maranhão – com o governador Flávio
Dino reeleito, no primeiro turno, e com Jair
Bolsonaro eleito presidente da República
-, Marco D’Eça anuncia que cultivará um
perfil ainda mais à esquerda, como diz nesta entrevista:

JP – O que de fato ocasionou a tua saída do
jornal O Estado do Maranhão?

Marco D’Eça – Trabalhei no jornal O Estado
do Maranhão por quase 25 anos. A redação
foi praticamente a minha casa na profissão
de jornalista. Mas a partir de 2014, com a
ascensão de uma nova geração da família
dona do jornal, os choques passaram a ser
inevitáveis. Diferenças de opinião e de posição que geravam atritos cada vez mais difíceis.
JP – Houve tentativa de censurar os teus
textos?

D’Eça – Não foi bem assim. O que ocorreu
é que algumas pessoas que não conheciam a realidade do Maranhão, a composição política
do estado, passaram a dar as ordens. Nunca escondi minha relação com Eliziane Gama,
Weverton Rocha e isso nunca foi problema
algum para o grupo. Mas os novos “donos”
passaram a se incomodar.
E a vitória dos dois para o Senado foi a gota
d’água. Sobretudo pela derrota de Sarney Filho, que era a esperança da manutenção de um certo
cacife político da família em Brasília. Mas
saio de cabeça erguida e com a certeza de que honrei cada minuto da minha passagem por este jornal, o que também me honra sobremaneira.

JP – Como foi, ao longo destes anos todos, a
tua relação com os Sarney?

D’Eça – Sempre tive uma postura política
de centro-esquerda, sempre votei em Lula
para presidente, desde sua primeira eleição, em 1989. Mas sempre respeitei a postura da família, que apoiou FHC em 1994 e 1998. E
todos sempre tiveram respeito pelas minhas convicções, embora isso não tenha deixado de gerar divergências em uma ocasião ou outra.
Mas de maneira respeitosa. Fiquei mais à
vontade a partir de 2002, quando os Sarney
passaram a dar apoio público a Lula, o que se consolidou em 2006 e 2010.

JP – E como foi agora neste pleito de 2018?

D’Eça – Bom, nestas eleições, fora do poder
já há quatro anos, o grupo ficou meio que
isolado em relação à eleição nacional. Eu
mantive minha posição histórica, apoiando
Fernando Haddad no primeiro e no segundo turnos. Ainda na redação durante o primeiro turno, os choques com a nova geração da família aumentaram. E vieram de forma mais desrespeitosa, o que gerou minha saída.

JP – O que explica a vitória de Flávio Dino e
a derrota de Roseana?

D’Eça – A derrota de Roseana estava
anunciada. Dificilmente se tem condições de vencer a força da máquina do governo usada de forma tão ostensiva. E Flávio Dino usou esta máquina de todas as formas. Mas houve erros graves não apenas do grupo Sarney, mas dos demais setores da oposição.

JP – Que erros foram estes?

D’Eça – Um deles: inventar uma chapa
kamikaze com Roseana e Sarney Filho juntos, tendo ainda Edison Lobão. No início da pré-campanha escrevi sobre isso, alertando sobre o “choque de gerações na disputa pelo Senado”. Fui bombardeado internamente por
esta opinião.
Outro erro: a invenção da candidatura do
senador Roberto Rocha, o que inviabilizou
Eduardo Braide como opção. Sem retirar os
méritos do próprio Flávio Dino nesta vitória, diria eu que qualquer um sentado na cadeira do Palácio dos Leões, com as condições amplamente favoráveis que surgiram, seria eleito governador.

JP – E como avalias a eleição de Weverton e
Eliziane?

D’Eça – Ainda em dezembro de 2016, lancei o nome de Eliziane Gama ao Senado, em minha página na internet. Ela havia deixado a disputa pela Prefeitura em quarto lugar e era vista como “morta politicamente”.
Na mesma época, começou-se a plantar a
campanha de Weverton pelo PDT, recém-
saído das urnas com uma vitória incontestável.
Naquela época, eu já apontava que o eleitor faria uma opção pela renovação no Senado. E havia outras opções de gente nova na política, como Alexandre Almeida, Bira do Pindaré, o próprio Eduardo Braide.
Weverton e Eliziane souberam combinar a
força da juventude com a estrutura partidária à disposição. Lembro que, ainda em junho, nos grupos de WhatsApp, quando Weverton aparecia apenas em 6º lugar, eu afirmava que ele seria o primeiro colocado. Eliziane já tinha um recall próprio, que só precisou da boa campanha na propaganda eleitoral e o “casamento” de voto com Flávio Dino.

JP – Tu te consideras amigo dos dois
senadores eleitos?

D’Eça – De fato, são dois amigos. Eliziane,
quase de infância (risos). Weverton, uma
relação familiar, bem próxima. De fato, fiquei muito feliz com a eleição dos dois.

JP – O que explica a vitória de Bolsonaro e a derrota do PT?

D’Eça – Bolsonaro é fruto de uma manipulação
do sistema político brasileiro que começou lá atrás, em 2013, com as tais “marchas dos 20 centavos”. Essa manipulação envolveu, além do mercado, setores influentes da própria mídia
e do Judiciário. E tinha um objetivo claro:
demonizar o PT, criminalizar suas lideranças para impedi-los de voltar ao poder no Brasil.
A princípio, queriam derrotar Dilma Rousseff (PT) no voto, em 2014; como não conseguiram, deram um golpe de estado para afastá-la.
Em seguida, prenderam Lula, com uma forte estigmatização midiática do PT. O resultado é isso que vimos no domingo, 28 de outubro.
Despreparado politicamente e incompetente administrativamente, o ex-capitão do Exército está claramente manipulado por setores do agronegócio, domercado paulista e de religiosos conhecidos pela ânsia de poder.

JP – Tuas últimas postagens têm cheiro de
uma guinada à esquerda. É isso?

D’Eça – Não há guinada à esquerda. Quem
me conhece, desde os tempos da Ufma, sabe de minha postura progressista. Sempre fui
defensor da causa, militei no apoio à equidade de gênero, sempre estive nas manifestações em defesa dos LGBT+ e tive uma visão de economiadesenvolvimentista, com a força do estado, inclusive, “carregando” os que não conseguem andar sozinhos.
O meu blog, hoje o mais antigo em atividade no Maranhão, expressa bem essa minha postura progressista, sobretudo nos costumes,
embora hoje já admita uma idéia mais liberal na economia. Mas não houve guinada alguma.
Houve de muitos colegas, lideranças, amigos, ao longo de minha carreira, tanto à direita quanto à esquerda. Mas eu me mantive nos trilhos.

JP – E que tu pensas do futuro do jornalismo impresso em face da disseminação da mídia digital?

D’Eça – Essa discussão sobre jornalismo
impresso já tem uns 15 anos, desde que
surgiram os primeiros portais de notícias na internet. É óbvio que o jornal como a gente conhece está fadado à extinção. Mas ainda é uma referência histórica, uma espécie de documento, um testamento a narrar a própria morte, diante das novas tecnologias.
Isso deve durar ainda uns 10, 20 anos. Mas a influência política dos jornais impressos ainda é muito significativa. Um exemplo nestas eleições foram os editoriais dos grandes jornais mundiais, como New York Times, Le Monde, que repercutiram no mundo inteiro; ou mesmo a postura autoritária de Jair Bolsonaro contra a Folha de S. Paulo, que conseguiu incomodá-lo com reportagens sobre sua verdadeira face.
JP – Que pretensões tens a partir de agora
com teu blog?
D’Eça – Costumo dizer que passei 15 anos
no jornal O Estado do Maranhão sem receber qualquer processo. A partir de 2006, com
o blog, ganhei quase um a cada dois dias
– felizmente nunca tendo sido condenado.
Entendo que o blog é isso, é a exposição de
cara lavada da nossa opinião. Somos nós
falando sem filtros, em edição ou revisão de terceiros.
Aliás, a expressão sem filtros é tema de uma de minhas teses de conclusão de curso na
área do jornalismo. Mesmo quem não me
conhece pessoalmente sabe o que eu penso
por intermédio do meu blog. Agora mais livre
editorialmente, pretendo reforçá-lo como
instrumento de formação de opinião. Quero continuar a influenciar os círculos de poder no estado.
JP – Além da carreira no jornalismo, tens
pretensões na vida político-partidária?
D’Eça – Embora minha carreira jornalística
tenha sido toda construída no jornalismo
político, nunca me filiei a partido algum.
Acredito que chegou o momento de uma
experiência mais orgânica do ponto de vista da militância política. Me agrada a possibilidade
de poder entrar diretamente no debate político, contribuir com a construção de uma sociedade mais justa e de poder influenciar mais diretamente os destinos de minha cidade e de meu estado.
Tenho conversado muito com lideranças
partidárias e aliados políticos. E não descarto esta possibilidade mais ativa de uma atuação política. Tenho convicção de que estou preparado para a missão e pronto para o embate com as mais variadas forças. Como diz o professor FHC, “tenho argumentos para
convencer; quem os tiver, persuada-me”.

Por : Manoel dos Santos Neto

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